.comment-link {margin-left:.6em;}

terça-feira, dezembro 20, 2005

Reverso

O cavalo branco subiu os três degraus que ficava na entrada da casa. Com a ponta do nariz cheirou a presença de algum morador naquele instante.
Passos leves transportavam a dona das mãos que, ao abrir a porta com cautela, não exitou em pôr a cabeça para ter a certeza da sua presença.
Na venta do animal escorria gotas de sangue que refletiam a aproximação da criança para junto de suas patas. Com a boca apontada ao alto, posição que incomodava a respiração, domou as ultimas gotas com a língua. O ar não competia com o prazer.
O cansaço dele já não estagnava em seu corpo – o olhar de acolhimento transbordava com uma vontade ultima do medo de um dia não poder mais lembrar das fraquezas.
Balançava o rabo com nervosismo, queria logo ser domado a entrar. Sabia que seria acariciado – ela sempre passava a mão entre seus olhos. Fechava-os ao sentir a doença escorrer entre as nascentes do rio. Ao mesmo, cheirava seu colo. Cheiro de leite dos tempos corridos – da outra oportunidade de encontro consigo.
Outros degraus o esperavam, iluminado pela luz refletida no teto espelhado. A cada passo: feixes de luzes que o cortavam sobre o corpo; sob: só devolvidos pelos olhos dela.
Só os passos dele estalavam nas escadas – seu cansaço e peso não proporcionariam sons menos iguais. Ela sempre sorridente e compreensiva aos seus passos. Levava-o com a mesma determinação das outras vezes.
Mas nem sempre as árvores balançam com a vontade dos ventos. Desceu e esperou-o ao começo da escadaria. Envolto num acreditar que algo de novo traria como inveja as suas dores, olhou-na e viu uma de suas mãos sugar-lhe de volta para seus braços.
Outra gota de sangue escorrera de dentro, dessa vez a tocar o chão de madeira.


arnon gonçalves